terça-feira, 23 de outubro de 2007

Uma escrita confessional

Os movimentos do pensamento nos pregam algumas peças. Ou será o inconsciente ainda, que mesmo atropelado pelo razão, nos atravessa? Bem. Hoje acordei e a primeira coisa que escrevi foi o seguinte: "Não vejo mais muita graça no escrever para confessar. Quanto mais a escrita se aproxima da confissão mais ela se aproxima da culpa. O papel torna-se padre. A escrita a reza. Afastar a escrita desse ponto. O mais interessante é quando a dor não mais fala, não mais se escreve para simplesmente dizer um sofrimento, e sim quando ela ultrapassa a dor mais individual para entrar na dor do mundo."

E a prova de que às vezes não estamos na altura do nosso pensamento, que escrevemos uma coisa e vivemos exatamente o contrário, foi reler tudo o que escrevi hoje (pouparei vocês de tais confissões ridículas...). Também não ficamos todo o tempo dentro de nossa própria vertigem. Nos traímos. E o que escrevi hoje ao longo do dia ficou cheirando a confessionário! A prova irrefutável foi, já de noite, eu ter me interessado em reler alguns trechos da "Consciência de Zeno". E o livro é de uma escrita confessional! Zeno é aquele que, mandado pelo seu psicanalista, escreve a história de suas dores para resolver os seus problemas. A escrita pode e deve mais.

Até que ponto, podemos nos perguntar, a confissão da escrita, ou a escrita do divã se assemelha àquela confissão cristã? O divã é o Deus moderno? Deus é um grande divã? A quem a culpa se dirige no divã? Não entendo nada de psicanálise para responder a tais questões. Mas creio que a escrita, a literatura pode ir além das próprias dores de um indivíduo. A literatura é a escrita da dor do mundo.

Um comentário:

Cacau disse...

Na minha opinião toda dor é ao mesmo tempo individual e universal. Universal pq a dor nos faz humanos como o resto da humanidade (que tautologia!), já que nosso alcance de Universo para na Terra mesmo!

Se você estiver certo, vivo "pecando" no meio literário! Afinal quase que só escrevo pra expurgar minhas dores. Mas acho que é válido usar o papel de Divã. Se a psicanálise é a atual religião da humanidade, então Freud é o nosso Deus (hehe).