Trabalhar profundo com aquilo que se tem. Esgotá-lo. Sorver tudo para liberar-se.
Um dos males de nosso tempo é mostrar inúmeras coisas, com suas vitrines e propagandas, e nos forçar a ser dependente daquilo que sabemos que existe mas não conhecemos. Corremos atrás do "necessário" futuro ter e nos esquecemos do material que até agora tão bem estruturou a nossa realidade. Como num conto de Kafka. O excelente trapezista depois de trabalhar anos com o mesmo trapézio sente repentinamente uma vontade inexorável de possuir um segundo: "Só com esta barra na mão, como é que posso viver?"E no entanto, já se viveu. Primeira dor. O homem contemporâneo é como o trapezista, só que ininterruptamente desejoso. Ele não domina nem o primeiro trapézio e já quer os outros, todos os outros. Em sua mão jaz um quebra-cabeça sem imagem a ser formada e sem dobras de encaixe. Quantas dores como a do trapezista inventamos todos dias? Ora é num objeto que agora cremos necessário, ora é num amor, numa profissão, num estado de coisas...até o infinito. A idéia de infinito é bela mas sempre suscita alguma angústia naquele que a vislumbra. Enquanto o homem a vislumbra, a vida fica assim:emperrada. E a impressão de que a vida presente é uma máquina obsoleta que nunca foi usada. Presente:esgotá-lo. Sorver e liberar.
segunda-feira, 12 de novembro de 2007
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Um comentário:
Há uma máquina antiga, mas não tão obsoleta assim, e muito bem azeitada, que deseja a tudo custo nos convencer que tudo o que temos é sempre pouco ou aquém das espectativas. Então consomem-se matérias, paixões, ideologias, et coetera...e o vazio parece não ter fim. Belo texto irmão !
Forte abraço !
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