segunda-feira, 2 de julho de 2007

Coisas anônimas

Nunca saiu de casa com pretensões de encontrar-se. Nunca conversou com alguém para dizer um pouco de si. Dizer-se ou encontrar-se: para isso bastava a solidão e a casa. Na medida em que saía dela ia esquecendo-a. O ônibus, a calçada irregular, os olhares enviesados dos passantes, tudo isso determinava o vôo de seu pensamento. Interferiam as nuvens carregadas desse dia que não conseguiam desaguar. Tão imerso ficava entre as coisas. Tão imerso que não lembrava para onde ia.

E quando chegava em algum lugar não procurava nenhuma semelhança. E que idiotice seria isso. Não procurava nada. E tão bem fazia isso – esse desinteresse por si – que nutria muita coisa. Dizer isso? Não. Para que? Quem entenderia? Ouvia tudo, deixava as pessoas falarem ao vento. Se perguntavam alguma coisa sobre ele, respondia quase sem vontade com infinitas expressões curtas.

Para ele era sempre o outro que estava em jogo. E essa satisfação era intransferível...essa tola descoberta desinteressada das coisas...das coisas inteiramente anônimas. Coisas sem dono: para retê-las precisava existir e consumi-las em silêncio. Saboreando-as. Anônimo entre outros, entre ele mesmo.

E ninguém entendia o motivo daquela expressão no seu rosto.

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